Descrição: Bandeja em prata branca e dourada, de formato oval, de grandes dimensões. Fundo em relevo representando um episódio do Evangelho de São Lucas, Cristo em casa de Marta e Maria, como atesta a inscrição gravada na base de uma coluna: "LUC. X. V. 39" (Lucas, 10, versículo 39: "E tinha esta uma irmã chamada Maria, a qual, sentando-se aos pés de Jesus, ouvia a sua palavra"). A fonte iconográfica para esta representação estará relacionada com uma pintura flamenga de autor não identificado que se conserva hoje nas coleções reais britânicas (RCIN 402646) que está datada 1700-1740, sendo talvez cópia ou versão de um original, porventura mais antigo (cf. doc. associada). Na aba, profusamente lavrada com folhagens, flores e frutos, quatro medalhões figurando outras cenas bíblicas. São estas, no sentido dos ponteiros do relógio: Rebeca e Eliezer (provavelmente); Aparecimento de Jesus Cristo a Santa Maria Madalena; Ceia em Emaús; episódio não identificado (Jesus Cristo e Nicodemos?).
Origem/Historial: Esta bandeja e o seu par integraram um diversificado conjunto de ourivesaria civil utilizado em cerimónias da Casa Real, tais como os batizados, a função régia do Lavapés de Quinta-Feira Santa e a decoração de aparadores em banquetes. Sabe-se terem sido utilizadas nos batizados reais para a apresentação de duas das suas insígnias: a “veste cândida” e o círio com moedas de ouro incrustadas (Jardim e Monteiro, 2012: 264-265). As fotografias antigas das mesmas revelam a presença de quatro asas de retrós, já desaparecidas, aplicadas através de pequenos orifícios abertos nas abas para o efeito, evidenciado a sua função de suporte e condução no contexto desse cerimonial. Em 1866 foram fotografadas por Charles Thurston Thompson para o South Kensington Museum (atual Victoria & Albert Museum), entre outras peças de ourivesaria das coleções reais selecionadas no ano anterior pelo art referee daquele museu, Charles Robinson, em visita a Portugal. Pouco depois foram também captadas por F. A. Gomes, tendo subsistido os respetivos colódios em vidro à guarda do Arquivo de Documentação Fotográfica da DGPC (cf. doc. associada). Chegaram a estar expostas, junto a outros objetos da Coroa e das coleções particulares do rei D. Luís, na Sala do Corpo Diplomático do Palácio da Ajuda, como documenta uma fotografia de Henrique Nunes datável de c. de 1880 (BA 232/4 Reg. 1494). Pelo menos um dos exemplares figurou em 1882 na Exposição de Arte Ornamental (extra catálogo), como se verifica numa fotografia de Carlos Relvas da Sala G. Outro foi reproduzido na revista "A Arte" (Agosto 1880:129), sendo objeto de elogiosas referências por parte de Joaquim de Vasconcelos no seu ensaio histórico sobre ourivesaria (Vasconcelos, 1882: 76-78). No final da monarquia, ambos os exemplares decoravam o gabinete de trabalho da rainha D. Amélia no Palácio das Necessidades, como também documenta uma fotografia da época (cf. doc. associada).
Na sequência da implantação da república (1910), foram as bandejas inventariadas na "Casa Forte" do Palácio das Necessidades, no agrupamento "Baixela Germain prata e ouro e outras peças de prata de fabricantes diversos", com o n.º 16952: "Duas bandejas grandes de prata dourada, configuração oval, feitio antigo, decoradas com folhas e flores em relevo e cinco medalhões embutidos e oxidados com gravuras em relevo alusivas às diversas passagens da sagrada escriptura; teem gravado a inicial M e pesam sete mil setecentos e dez gramas (Arquivo do PNA, Arrolamento do Palácio das Necessidades, vol. VII). Permaneceram na casa-forte desse palácio e, em 1956, seriam transferidas para o da Pena. Em 1957, por solicitação do Secretariado Nacional de Informação, foram cedidas para a decoração do almoço oferecido à rainha Isabel II, no Mosteiro de Alcobaça. Encontra-se desde 2020 em regime de depósito no Palácio Nacional da Ajuda para integrar o núcleo "Prata de Aparato da Coroa" do Museu do Tesouro Real.
Incorporação: Palácio das Necessidades, 1956. Cf. "Relação de peças existentes na Casa-Forte do Palácio das Necessidades, destinadas ao Palácio Nacional da Pena", datada de Novembro de 1956, com o n.º 16952: "Duas bandejas de prata dourada, ovais, decoração folhas e flores em relevo, 5 medalhões embutidos e oxidados em relevo, alusivos às escrituras sagradas, iniciais: M. Peso: 1,710 grs" [Arquivo do PNP - Movimentação de Objetos].
Centro de Fabrico: Augsburgo, Alemanha
Bibliografia
MARTINS CARNEIRO, José Manuel; Luís Eduardo da Mota Veiga Castelo Lopes - Exposição de Ourivesaria do Palácio Nacional da Pena. Sintra: Palácio Nacional da Pena, 1986
JARDIM, Maria do Rosário; MONTEIRO, Inês Líbano - "A prata do solene aparato da coroa portuguesa (a partir da 2ª metade do século XVIII). Identificação de um conjunto de 23 obras dos séculos XVI a XVIII". Revista de Artes Decorativas, n.º 4. UCP/CITAR: Porto, 2010, pp. 11-48.
VASCONCELOS, Joaquim - "A ourivesaria portuguesa: ensaio histórico: [s. n.] [s. d. 1882]
JARDIM, Maria do Rosário; MONTEIRO, Inês Líbano - "A prata de aparato das cerimónias régias (a partir da 2ª metade do século XVIII)". Actas do III colóquio português de ourivesaria. Porto: UCU. 2012, pp. 249-271.
Exposições
Exposição de Ourivesaria do Palácio Nacional da Pena
Palácio Nacional da Pena, Sintra
Exposição Física
Exposição Retrospectiva de Arte Ornamental Portuguesa e Espanhola