Demónio - cabeça

  • Museu: Museu Nacional do Azulejo
  • Nº de Inventário: MNAz 881 Cer
  • Super Categoria: Arte
  • Categoria: Cerâmica
  • Autor: Semke, Hein (Hamburgo, 1899 - Lisboa, 1995)
  • Datação: 1959
  • Técnica: Moldada
  • Dimensões (cm): Alt. 45,5 x Larg. 32 x Prof. 4
  • Descrição: Placa cerâmica. Sobre fundo retangular vertical esverdeado, contornada a preto: uma cabeça frontal vermelha escura delineada em "fita" verde e azul claras - rosto trapezoidal, quase quadrado, encimado por uma estreita auréola de cabelo de onde saem dois grandes chifres oblíquos castanhos rosados, sobrancelhas e nariz em "T",olhos minúsculos de onde descem duas rugas em "/ \", orelhas normais, grande boca horizontal entreaberta e largo pescoço cilíndrico com duas circunferências inscritas em cima e uma em baixo a meio.
  • Origem/Historial: Cf.D59/26,4 talvez para um primeiro esquiço e D59/5,8 (KD580/59-8,6) para o desenho, onde o artista escreveu como título explicativo "Lembrando o = Vilas Boas=". A inscrição refere-se ao crítico de arte Selles Paes Vilas Boas, que a cabeça de demónio - tanto do desenho como da placa cerâmcia - retrata, como recordação da sua agressão ao escultor em 1958. A história é a seguinte: Algum tempo antes da abertura da Exposição de Hein Semke na Galeria do Diário de Notícias, em março de 1958, Vilas Boas vai ao atelier do artista e, na presença da Gret (Margarida Schimmelpfennig) e da Zinha, pretende compar uma obra sua: uma escultura representando uma figura feminina agachada, com as mãos dos lados (provavelmente a terracota Anunciação, de 1950, apresentada em março de 1951 na Exposição de Hansi Stael e Hein Semke na SNBA). O escultor pede 2.000$00 por ela. Vilas Boas diz que pagará mais tarde, leva-a e tê-la-á vendido. A seguir publica sobre a exposição uma crítica insidiosa. Aconselhado (pela Maria Eduarda Medeiros, a Bébé Lino Gaspar) a reagir, o artista põe no dia 6 de abril um anúncio num jornal vespertino, solicitando a devolução da sua obra que não lhe fora paga. Uma semana depois, na tarde de Domingo de Páscoa, estando Hein Semke com a Gret e outros, sentado à mesa da "Brasileira", Vilas Boas ataca-o de surpresa pelas costas. Sentindo-se agredido Hein Semke vira-se, agarra Vilas Boas e, derrubando uma mesa, imobiliza-o, ao mesmo tempo que pede à Gret que chame imediatamente a Polícia. Um maquetista e quatro outras pessoas presentes separam os dois. A reação violenta de Hein Semke, sempre calmo e pacífico, a um ataque que não era frontal, foi automática, resultando do seu treino militar como membro da tropa de reconhecimento na primeira guerra mundial. Pertencera então a um corpo de soldados que á noite atravessava as linhas da frente para recolher informações sobre as posições inimigas. Hein Semke não gostava de falar na guerra nem conseguia ver filmes de guerra. Contou-me isto uma vez, referindo ainda que por vezes conversava sobre ela com Hernâni Cidade, que combatera em campo oposto. Lembro-me de que numa ocasião o meu pai tamborilava com os dedos na mesa e Hein Semke lhe pediu para parar. Perante o espanto do meu pai, justificou brevemente que não suportava o som, que lhe lembrava o da metralha. A polícia não demorou e pode felizmente confirmar quem fora o agressor; o artista receava que se ela demorasse, a verdade do sucedido não pudesse vir a ser atestada e ele, como estrangeiro, fosse expulso de Portugal. Hein Semke e Vilas Boas foram então levados para a esquadra do teatro D. Maria e um polícia acompanhou ao hospital o escultor, a quem Vilas Boas partira a cabeça. Presenciaram a agressão várias pessoas que se encontravam na Brasileira, entre elas João Hogan, de quem Hein Semke era amigo e continuou a ser, mas que no entanto se recusou a testemunhar em tribunal. Prontificaram-se a fazê-lo uma senhora e o seu filho e filha que estavam na Brasileira e que Hein Semke não conhecia. (O filho trabalhou mais tarde com a Caritas, foi através dele que Hein Semke conseguiu que viessem de África para Lisboa os dois sobrinhos da arquiteta Celeste Costa.) Como testemunhas abonatórias Hein Semke teve ainda o apoio do eng. António Vasconcelos e de Delfim Maia. Vilas Boas, que era crítico de artes plásticas, teve naturalmente o apoio de vários artistas e pintores. Apesar de o advogado de Vilas Boas ser um dos melhores do Porto e presidente (?) da União Nacional, perdeu o processo; o advogado de Hein Semke, era o advogado dos ciganos e filho do chefe de publicidade do Coliseu. Pouco antes Diogo de Macedo dissera a Hein Semke que devia voltar para a Alemanha. "Não tinham nada contra ele, aqui, mas não gostavam dele". A agressão na Brasileira insere-se nesta corrente de oposição ao escultor alemão. A viragem de Diogo de Macedo, que fora amigo de Hein Semke nasceu na crítica que Semke fez a Reynaldo dos Santos (de quem Diogo Macedo era amigo) pelo facto de andar a trocar por imagens de barro de Nossa Senhora de Fátima, as esculturas medievais das igrejas da província, que trazia para a sua coleção particular. Hein Semke sempre disse directamente o que pensava, sem maldade nem ressentimento, mas com frontalidade, o que obviamente lhe granjeou inimigos. O escritor Daniel Filipe aproveitou a ocorrência para um conto seu em que critica diretamente o escultor. Sobre a questão há cartas e referências no diário de Semke. (Cf.K225/59-12,1) (Cf.também KF42/50-1) Elementos da inventariação efectuada pela Dra. Teresa Balté. Hein Semke (1899-1995) nasceu em Hamburgo e, após uma primeira visita em 1929, radicou-se em Portugal em 1932, onde viveu até à sua morte. Escultor, ceramista, desenhador e gravador, Semke deixou uma poderosa obra cerâmica, de forte pendor expressionista radicado na sua cultura alemã.
  • Incorporação: Doação de Dra.Teresa Balté
  • Centro de Fabrico: Lisboa, Portugal

Bibliografia

  • S(elles) P(ais), "Artes Plásticas. Cerâmicas de Hein Semke", in: Diário Ilustrado, 29/3/58
  • Artur Portela (filho), "Feira das Vaidades. O Crítico e o Artísta", in: Diário de Lisboa, 25/4/58.

Exposições

  • Exposição de Cerâmicas de Hein Semke e Pinturas de João Santiago

    • S.N.B.A , Lisboa
    • Exposição Física
  • Exposição de Pinturas, Cerâmicas e Desenhos de Hein Semke

    • S.N.I, Lisboa
    • Exposição Física
  • Hein Semke - 40 Anos de Actividade em Portugal

    • G.E.T, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa
    • Exposição Física
  • Exposição de Cerâmicas e Desenhos de Hein Semke

    • Ateneu Comercial, Porto
    • Exposição Física
  • Exposição de Pintura, Escultura e Cerâmica de Hein Semke

    • Galeria S.Mamede, Lisboa
    • Exposição Física

Multimédia

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