Descrição: Bolsa de xamã de forma semi-elíptica constituída por várias tiras de wixato dispostas paralelamente, unidas entre si em dois terços do comprimento, com fios de algodão de cor vermelha, branca e castanha.
A peça apresenta um cordão de algodão de cor vermelha e branca que a percorre em todo o comprimento e envolve as extremidades. Este cordão é utilizado para fechar a peça, que no seu interior contém oito cigarros de xamã, em folhas de tabaco na... Ver maistivo.
Os cigarros cilindriformes, apresentam uma das extremidades enegrecida pelo fogo, e apenas seis têm a extremidade oposta envolvida com fibra vegetal.
Origem/Historial: O valor simbólico desta peça advém do estatuto do seu proprietário na sociedade Wauja. O xamã é um indivíduo que possui um poder terapêutico e prestígio ritual, devido à sua capacidade de resgatar as almas levadas pelos seres sobrenaturais, quando este vai à casa de um doente exercer os seus serviços de cura e adivinhação faz-se acompanhar de uma bolsa. A bolsa feita de simples tiras vegetais unidas por fios de algodão tem como fun... Ver maisção guardar os objectos usados em rituais xamâmicos, nomeadamente o chocalho, vários cigarros e outros objectos usados no ritual. Deste modo, o simbolismo da bolsa provém do facto de esta ser de uso exclusivo dos xamãs e do papel que esta desempenha no decorrer da actividade ritual, pois é nela que são depositados os elementos de intervenção ritual.
Segundo Aristóteles Barcelos Neto "a bolsa do xamã integra aquele conjunto de artefatos indígenas que, no campo costumamos chamar de "raros". A raridade da tuapi não se deve à sua dificuldade de execução, nem à escassez das matérias-primas que o compõem (...)"(Os Índios, Nós, 2000: 134). A raridade deste tipo de peça prende-se com o seu reduzido número, que de certa maneira surge associado ao reduzido número de xamãs e com as reservas que lhe são impostas devido à sua associação ao xamanismo. Por estes motivos torna-se muito difícil à aquisição deste tipo de objectos.
A existência desta bolsa no espólio do Museu Nacional de Etnologia deve-se a um rigoroso trabalho de campo do qual resultou uma excelente colaboração por parte do antropólogo e dos índios. A peça foi cedida espontaneamente pelo seu proprietário, um jovem xamã de seu nome Tuhu, juntamente com vários cigarros de tabaco nativo, alguns deles já consumidos e um chocalho.
"A bolsa do xamã integra aquele conjunto de artefatos indígenas que, no campo costumamos chamar de "raros". A raridade da tuapi não se deve à sua dificuldade de execução, nem à escassez das matérias-primas que o compõem. As tuapi são fabricadas para o uso exclusivo dos xamãs yakapá (literalmente aquele que corre em busca da alma roubada) e pukayekeho (xamãs cantores). (...) O reduzido número de tuapi e as reservas em torno das coisas ligadas ao xamanismo tornam a bolsa do xamã Wauja um artefato de difícil aquisição. A tuapi que coletei para o Museu Nacional de Etnologia foi espontaneamente oferecida por um jovem xamã, juntamente com o seu waun (chocalho de cabaça) e vários cigarros de tabaco nativo (hoká), alguns deles consumidos pela metade ou menos. (...) A bolsa é feita a partir do encordoamento de fios de algodão nativo, tingindos de vermelho, com finas lascas polidas de uma fibra vegetal conhecida por tsaixu (matéria-prima frequentemente presente nas passagens dos mitos que relatam a fabricação de "roupas sobrenaturais" por humanos ou seres extra-humanos). Os fios de algodão coloridos são fabricados pelas mulheres da aldeia, enquanto a obtenção do tsaixu é usualmente masculina, a fabricação da tuapi pode ser tanto masculina quanto feminina." (cf. Os Índios, Nós, pp. 134)
Nota informativa sobre a constituição da Colecção Wauja 2000:
O projecto de constituição de uma colecção etnográfica entre os índios Wauja, um povo de língua Arawak, estabelecido unicamente nas proximidades da margem direita do rio Batovi, na região ocidental da bacia dos formadores do rio Xingu, no Estado de Mato Grosso, na Amazónia Meridional, foi desencadeado pelo MNE, conduzido no terreno pelo antropólogo Aristóteles Barcelos Neto e apoiado financeiramente pela Comissão Nacional para a Comemoração dos Descobrimentos Portugueses, durante o ano de 2000. A formação desta colecção resultou da conjuntura particular da preparação da exposição Os Índios, Nós. Refira-se que nesta conjuntura aquela Comissão foi parceira financeira no projecto da exposição.
A investigação no terreno ficou a cargo do antropólogo Aristóteles Barcelos Neto, uma vez que já tinha realizado trabalho de campo na aldeia Wauja do Alto Xingu, em 1998, a partir do qual elaborou a tese de mestrado Arte, estética e cosmologia entre os Índios Waurá da Amazônia Meridional (1999), defendida na Universidade Federal de Santa Catarina. Constituiu ainda, no mesmo território e entre o mesmo grupo, uma colecção etnográfica para o Museu de Arqueologia e Etnologia da Bahia. Baseando-se na sua própria experiência e conhecimento da tribo elaborou um projecto para o MNE, intitulado Cultura material amazónica: sociologias e cosmologias nativas.
O objectivo fulcral da investigação assentou na formação e documentação de uma colecção sistemática de artefactos, representativa da cultura material dos índios Wauja do Alto Xingu.
A colecção, constituída por 578 peças, abrange todas as classes de artefactos excepto a plumária, devido às actuais leis brasileiras que proíbem a sua exportação.